Os locais onde se encontrem postos de trabalho também têm de ser acessíveis, ou essa obrigação só existe para os espaços destinados ao público?
Em princípio estão abrangidos.
Mas vamos por partes.
Em primeiro lugar, no âmbito das normas do DL 163/06, o que se deve entender por “posto de trabalho acessível”?
Neste ponto, deve sublinhar-se que nestas normas não são especificadas orientações relativamente a postos de trabalho específicos.
Inútil seria fazê-lo: por um lado, devido à imensa diversidade de tarefas existentes no mercado de trabalho; por outro, devido às necessidades específicas, também, elas muito variadas, que cada trabalhador pode sentir. A adaptação de um posto de trabalho conjuga as necessidades de determinada tarefa com as necessidades de determinado trabalhador.
Nada se especificando sobre o posto de trabalho propriamente dito, as normas debruçam-se sobre o meio edificado que o envolve, e que permite (ou não) aceder-lhe em condições de igualdade.
Assegurar o acesso
Embora os espaços destinados a funcionários não sejam, de uma forma geral, referidos no DL 163/06, uma leitura atenta das normas revela que nada os exclui, muito pelo contrário.
Salvo algumas excepções, as normas não fazem distinções de princípio entre espaços destinados ao público ou a funcionários, preocupando-se, isso sim, em salvaguardar a interligação de todos os espaços do edifício por meio de um percurso acessível.
Por isso, no âmbito das normas do DL 163/06, a questão que se coloca não é a da acessibilidade "do" posto de trabalho mas a do acesso "a" todos os espaços do edifício, incluindo aquele onde se encontre esse posto de trabalho e todos os outros espaços destinados aos funcionários (instalações sanitárias, vestiários para pessoal, etc.).
Por outras palavras, à partida o que está em causa é saber se os espaços destinados a funcionários terão de ter acesso através do percurso acessível.
E a conclusão a que devemos chegar é, claramente, que sim.
Podemos ler no ponto 2.1.1:
“Os edifícios e estabelecimentos devem ser dotados de pelo menos um percurso (…) acessível, que proporcione o acesso (…) entre a via pública, o local de entrada/saída principal e todos os espaços interiores e exteriores que os constituem.” (negrito nosso)
Quando, no ponto seguinte (2.1.2), se enumeram os espaços que podem não ser alcançáveis por meio do percurso acessível, nada encontramos que suporte a exclusão dos espaços destinados aos funcionários.
Note-se que quando na alínea 3) desse ponto se dispensam os “espaços de serviço que são utilizados exclusivamente por pessoal de manutenção e reparação”, os exemplos referidos não deixam qualquer margem para interpretações mais abrangentes (casa das máquinas de ascensores, depósitos de água, espaços para equipamentos de aquecimento ou de bombagem de água, locais de concentração e recolha de lixo, espaços de cargas e descargas).
Para além do percurso
Coloca-se, agora, uma segunda questão: quais as exigências relativamente aos restantes espaços destinados a funcionários?
Vale a pena fazer uma distinção. Os princípios a seguir diferem consoante se trate dos espaços onde se localizarão os postos de trabalho propriamente ditos (gabinetes de trabalho, cozinhas, etc.) e outros espaços destinados aos funcionários (instalações sanitárias, vestiários para pessoal, etc.).
Sobre os espaços onde se localizarão os postos de trabalho, muito pouco se refere nas normas, e o que se refere é pelo lado do público (por ex., Secção 2.12, Balcões e guichés de atendimento).
Ao princípio já enunciado (assegurar o acesso pelo percurso acessível) junta-se apenas um outro, bastante genérico: assegurar no interior de cada espaço o cumprimento das normas gerais aplicáveis, pressupondo-se que condições mais específicas deverão resultar de adaptações para funcionários específicos.
Relativamente aos outros espaços destinados aos funcionários, o princípio a seguir deverá ser o da igualdade de oportunidades de uso, i.e., os espaços que existirem (ou que tiverem de existir, por via da legislação aplicável no domínio da salubridade e segurança no trabalho) têm de ser utilizáveis por todos.
Nestes termos, se houver instalações sanitárias destinadas ao uso exclusivo dos funcionários, pelo menos uma terá de cumprir as normas do DL 163/06, constantes da Secção 2.9. E terá de considerar-se previsível o uso frequente dessa IS por pessoas com a mobilidade condicionada, exigindo-se assim o cumprimento das exigências referidas nos pontos 2.9.4, alínea 4), ou 2.9.6? A pergunta é pertinente, mas a resposta cabe à entidade licenciadora.
Uma mudança importante
Esta “obrigação” de assegurar a acessibilidade aos espaços destinados a funcionários não é, em rigor, nova.
Também o DL 123/97 não excluía expressamente, em nenhum dos seus pontos, estes espaços. Todavia, nas suas normas não continha o conceito de percurso acessível nem a obrigação de todos os espaços do edifício terem de ser alcançáveis por meio deste percurso.
Se dúvidas restarem sobre a intenção do legislador, uma breve consulta ao âmbito de aplicação do DL 163/06 torna-a mais clara: ao contrário do DL 123/97, que abrangia edifícios e estabelecimentos abertos ao público, o DL 163/06 já inclui, por exemplo, edifícios e centros de escritórios (cfr. Art. 2.º, n.º 2, alínea s)).
Para melhor entender este conceito da inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, vale a pena consultar o Decreto-Lei n.º 29/2001 de 3 de Fevereiro, que estabeleceu o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência nos serviços e organismos da administração central e local e entidades afins. No seu Artigo 2.º, especifica-se que as pessoas com deficiência abrangidas pelo sistema de quotas são aquelas que “possam exercer, sem limitações funcionais, a actividade a que se candidatam ou, apresentando limitações funcionais, estas sejam superáveis através da adequação ou adaptação do posto de trabalho e ou de ajuda técnica.”
Aplicação ao “mundo real”
É natural que uma interrogação se imponha: estas exigências são aplicáveis no “mundo real”? Dois breves comentários a esse propósito.
O primeiro sobre qual é, de facto, a realidade. A este respeito, não restam dúvidas: há uma significativa desvantagem no acesso ao emprego por parte das pessoas com deficiência.
Basta olhar para os dados do Censos 2001 relativos a Lisboa: só 23% da população residente com deficiência tinha o trabalho como principal meio de subsistência, quando a média para o total da população residente era de 49%.
É verdade que essa desvantagem resulta de uma conjugação de factores, mas as barreiras à acessibilidade nos edifícios e no espaço público constituem um factor objectivo e relevante, que acentua preconceitos e favorece práticas discriminatórias.
O segundo comentário sobre a aplicabilidade das normas ao parque edificado. Aqui, uma chamada de atenção para a distinção que tem de ser feita – e que o DL 163/06 prevê – entre a aplicação das normas aos edifícios existentes e aos edifícios novos.
É natural que a aplicação das normas aos edifícios existentes levante dificuldades por vezes insuperáveis. Em relação a essas, haverá que seguir o regime de excepções previsto no Artigo 10.º.
Atender ao âmbito de aplicação
É importante não perder de vista o âmbito de aplicação do DL 163/06 (cfr. Artigo 2.º).
Por exemplo: está em causa a obrigação de assegurar a acessibilidade aos postos de trabalho existentes, por exemplo, nas fábricas? Não está, porque as fábricas não são abrangidas por este decreto…
Quanto aos estabelecimentos comerciais, um detalhe importante. Estão abrangidos os estabelecimentos cuja superfície de acesso ao público ultrapasse os 150m2. Para a contagem dessa área não entram os espaços destinados a funcionários, como é óbvio. Mas esses espaços terão de ser acessíveis se o estabelecimento estiver abrangido por via da área destinada ao público.
PHG 11JUN2007
segunda-feira, junho 11, 2007
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