sexta-feira, junho 22, 2007

Habitação: obrigatório mínimo de 2 ascensores?

O RGEU exige um mínimo de dois ascensores nos edifícios de habitação colectiva. Sempre que nos termos do DL 163/06, tiverem de ser instalados ascensores em edifícios de habitação, será obrigatório instalar um ou dois? E se forem instalados dois ascensores, ambos terão de ser acessíveis, ou basta um deles cumprir as normas?


São colocadas duas questões, que veremos separadamente.


1.ª Questão: se houver um, terá de haver dois?

Não necessariamente.

O Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) faz, de facto, no seu Artigo 50.º, n.º 2, referência a um mínimo de dois ascensores.

Esse mínimo, todavia, aplica-se apenas aos casos em que o próprio RGEU torna obrigatória a instalação de ascensores. E que casos são esses? Nos termos do n.º 1 do Artigo 50.º, “quando a altura do último piso destinado a habitação exceder 11,5m”.

Como já referimos num texto anterior (vide abaixo “Habitação: contagem de pisos para ascensor”), a regra definida pelo RGEU para determinar a obrigação de instalar ascensores é diferente da regra do DL 163/06.

Nesta situação, como vimos, impõe-se, uma leitura conjugada da regulamentação aplicável, prevalecendo sempre o maior grau de exigência aplicável a cada caso.

Quando o RGEU não exigir ascensores, mas o DL 163/06 os exigir, será obrigatório instalar dois?

Salvo melhor opinião, não será obrigatório, porque o DL 163/06 não define um número mínimo de ascensores, depreendendo-se que exige pelo menos um, e não necessariamente dois.


2.ª Questão: se houver dois, basta um ser acessível?

Depende.

Nos termos do ponto 2.1.1, cada edifício deve ser dotado de “pelo menos um percurso (…) acessível, que proporcione o acesso (…) entre a via pública, o local de entrada/saída principal e todos os espaços interiores e exteriores que os constituem.”

O ascensor é um meio mecânico de comunicação vertical integrado no percurso acessível do edifício.

Enquanto elemento desse percurso acessível, a sua função é assegurar a existência de “pelo menos um percurso”, ligando todos os pisos a que esse percurso tem de chegar.

Naturalmente, só um ascensor que cumpra as normas de acessibilidade (nomeadamente as constantes da Secção 2.6) poderá integrar o percurso acessível.

Caso os dois ascensores sirvam espaços diferentes, ambos terão de ser acessíveis.

Caso os dois ascensores sirvam exactamente os mesmos pisos, poderá apenas um deles ser acessível, desde que o ascensor acessível funcione de forma autónoma, i.e., desde que possa, por exemplo, ser chamado individualmente (se assim não fosse, a presença num piso de um ascensor não acessível impediria uma pessoa com a mobilidade condicionada nesse piso de chamar o ascensor acessível).


Rigor no cumprimento dos mínimos

As normas do DL 163/06 relativas aos ascensores definem condições mínimas abaixo das quais a acessibilidade é inviabilizada, pelo que deve ser exigido o seu cumprimento rigoroso.


PHG 22JUN2007

Agradecimentos: João Branco Pedro

DL 163 comentado e ilustrado

Esta disponível online o Guia "Acessibilidade e Mobilidade para Todos", onde poderá encontrar uma versão comentada e ilustrada do DL 163/06.

http://www.inr.pt/uploads/docs/acessibilidade/GuiaAcessEmobi.pdf

Recomenda-se a visita.

Agradeço ao Arq. Jorge Guerreiro a sugestão.

quinta-feira, junho 21, 2007

WC: porta de antecâmara

Se houver instalações sanitárias para deficientes integradas numa bateria de cabinas, sabemos que as portas dessas cabines terão de abrir para fora. Caso exista uma antecâmara comum a todas essas cabinas, a porta dessa antecâmara também terá que abrir para fora (ou ser de correr), mesmo que no interior haja espaço para a manobra de 360º, ou poderá abrir para dentro?


Deverá abrir para fora.

Sobre as portas das instalações sanitárias (IS) de utilização geral, referem as normas, no seu ponto 2.9.20:

“A porta de acesso a instalações sanitárias ou a cabinas onde sejam instalados aparelhos sanitários acessíveis deve ser de correr ou de batente abrindo para fora.”

Nos edifícios existentes onde não seja possível, no âmbito de obras de adaptação, cumprir esta regra, haverá que assegurar, pelo menos, o cumprimento do ponto 2.9.19, alínea 1):

“[No] espaço que permanece livre após a instalação dos aparelhos sanitários acessíveis nas [IS] deve (…) ser possível inscrever uma zona de manobra não afectada pelo movimento de abertura da porta de acesso, que permita rotação de 360º”.

Vale a pena sublinhar que se o movimento de abertura da porta se sobrepuser, mesmo que parcialmente, à zona de manobra no interior da IS, as instalações não serão acessíveis.


Porta de acesso

Por “porta de acesso a instalações sanitárias” deve entender-se a porta de entrada no compartimento (ou conjunto de compartimentos) onde se localizam as IS.

As normas prevêem a existência de IS com ou sem cabinas. Uma “cabina” é uma subdivisão da IS onde se localiza parte dos aparelhos sanitários (frequentemente, as sanitas). Nas IS com cabinas haverá uma área comum com outros aparelhos (frequentemente, os lavatórios e respectivos acessórios).

Se a “antecâmara” a que a pergunta faz referência corresponde a essa área comum, então trata-se de uma área da IS, e a sua porta terá de abrir para fora, mesmo que no seu interior exista uma zona de manobra de 360º.


PHG 21JUN2007

Habitação: recuperação de casa com 80 anos

Estou a recuperar uma casa construída há mais de 80 anos. Não fiz grandes alterações estruturais: apenas reconstrução do tecto, reforço da estabilidade e criação de uma casa de banho com melhores condições. Agora dizem que eu preciso de apresentar o plano de acessibilidades. Concordo com a legislação em vigor, acho que é importante assegurar o acesso fácil às pessoas condicionadas fisicamente… mas numa casa particular? Se eu tiver de seguir as normas vou ter que partir muita coisa. Não há orçamento que resista...


A questão que coloca suscita-nos três comentários, todos eles referentes a esclarecimentos já publicados neste blog.


Obras de recuperação?

Não se tratando de obras de construção ou de ampliação, as normas do DL 163/06 não se aplicam ao seu projecto.

Tal como DL 555/99 já o fazia (cfr. Artigo 60.º, n.º 2), o DL 163/06 consagra o princípio da protecção do existente em matéria de obras de edificação.

Poderá verificá-lo lendo, no DL 163/06, o Artigo 3.º, n.º 2: “A concessão de licença ou de autorização para a realização de obras de alteração ou reconstrução das edificações referidas, já existentes à data da entrada em vigor [deste DL] não pode ser recusada com fundamento na desconformidade com as presentes normas técnicas de acessibilidade, desde que tais obras não originem ou agravem a desconformidade com estas normas”.

(vide texto abaixo: “Licenciamento: obras de ampliação abrangidas?”)


Aplicação gradual das normas

Pelas suas palavras deduzo que já submeteu ou que vai submeter em breve o seu projecto para apreciação. Se o entregar agora tem de cumprir essas normas?

O DL 163/06 estabelece no seu Artigo 23.º uma forma gradual de aplicação das normas de acessibilidade às áreas privativas dos fogos.

Todos os prazos são contados com base no “ano subsequente à entrada em vigor” deste decreto. Esta expressão tem sido interpretada de forma diferente.

Defendemos que se deve entender que as normas do DL 163/06 se aplicam às áreas privativas dos fogos destinados a habitação dos edifícios cujo projecto de licenciamento ou autorização dê entrada na respectiva câmara municipal a partir de 1 de Janeiro de 2008.

(vide texto abaixo: “Habitação: normas em vigor a partir de quando?”)


Plano de acessibilidade

O DL 163/06 refere no seu Artigo 3.º, n.º 5, que “os pedidos (…) devem ser instruídos com um plano de acessibilidades (…) nos termos regulamentados na Portaria n.º 1110/2001 de 19 de Setembro”.

Todavia, consultada essa portaria (que foi publicada anos antes deste decreto), verificamos que nada consta de específico sobre esse plano de acessibilidades.

Quando uma lei diz que algo será especificado numa portaria, a obrigação não existe até essa portaria conter as especificações em causa, deduzindo-se por isso que por enquanto a instrução dos pedidos com o plano de acessibilidades ainda não é exigível.

(vide texto abaixo: “Plano de Acessibilidade: o que fazer sem a portaria?”)


PHG 21JUN2007

sexta-feira, junho 15, 2007

Habitação: lugar de estacionamento supletivo

O novo decreto exige nos edifícios de habitação colectiva um lugar de estacionamento a mais só para deficientes. Tem de se cumprir, mesmo que não haja deficientes a residir naquele prédio? E depois só lá podem estacionar deficientes, os condóminos não? Quem vai fiscalizar?


Temos uma interpretação diferente. Consideramos que se pretende outra coisa.


Referem as normas do DL 163/06, no seu ponto 3.2.6:

“Em espaços de estacionamento reservados ao uso habitacional, devem ser satisfeitas as seguintes condições:

1) O número de lugares reservados para veículos de pessoa com mobilidade condicionada pode não satisfazer o especificado no n.º 2.8.1, desde que não seja inferior a: um lugar em espaços de estacionamento com lotação inferior a 50 lugares; dois lugares em espaços de estacionamento com uma lotação compreendida entre 51 e 200 lugares; um lugar por cada 100 lugares em espaços de estacionamento com uma lotação superior a 200 lugares;

2) Podem não existir lugares de estacionamento reservados para pessoas com mobilidade condicionada em espaços de estacionamento com uma lotação inferior a 13 lugares;

3) Os lugares reservados para pessoas com mobilidade condicionada devem constituir um lugar supletivo a localizar no espaço comum do edifício.”

Vale a pena analisar as diversas questões, uma a uma.


Espaços comuns

Sendo feita, no início do ponto 3.2.6, uma referência algo genérica a espaços de estacionamento “reservados ao uso habitacional”, convém especificar que (atendendo ao título da Secção 3.2) as regras estabelecidas nesse ponto 3.2.6 dizem respeito apenas aos espaços de estacionamento localizados nos espaços comuns dos edifícios de habitação.

Por outras palavras, esta regra não diz respeito a espaços de estacionamento localizados na via pública.

Note-se que a única razão pela qual se faz referência ao ponto 2.8.1 é para especificar que, nos espaços comuns de edifícios de habitação, se estabelece uma forma de cálculo de lugares de estacionamento acessíveis bem menos exigente.


Lugar Supletivo

Segundo o Moderno Dicionário da Língua Portuguesa (Editora Michaelis), “supletivo” é algo “que serve de suplemento”. Suplemento, por sua vez, é “a parte que se junta a um todo para o ampliar ou aperfeiçoar; aquilo que serve para suprir qualquer falta; complemento”.

O lugar de estacionamento supletivo será, portanto, um lugar a criar para além dos espaços afectos ao uso dos moradores, cujo número será determinado, em princípio, pelas regras aplicáveis ao projecto em causa (por via do loteamento aprovado ou de regulamentos ou planos municipais de ordenamento em vigor).

Se da aplicação dessas regras resultar um número de base superior a 50 lugares, haverá que assegurar-se a existência de dois ou mais lugares supletivos.

Segundo pudemos apurar, esta regra terá sido introduzida para harmonizar o DL 163/06 com o disposto na proposta de revisão do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU).

Esta nova versão do RGEU, que ainda não foi aprovada (nem se sabe, em rigor, se e quando o virá a ser), prevê a exigência de um lugar supletivo em edifícios de habitação colectiva com mais de 12 lugares de estacionamento.


Lugar adicional & acessível

Pretende-se, portanto, que para além dos espaços de estacionamento calculados em função das habitações, exista (pelo menos) um espaço adicional reservado para veículos de pessoas com mobilidade condicionada.

Esse lugar de estacionamento terá de cumprir na íntegra as normas estabelecidas na Secção 2.8 que forem aplicáveis.

Esta exigência vem na linha das outras normas relativas aos edifícios de habitação, que de um modo geral têm como objectivo assegurar:

…a acessibilidade aos espaços comuns, para permitir a utilização do edifício por pessoas com mobilidade condicionada, sejam visitantes ou moradores, na sua situação presente ou futura;

…a adaptabilidade da habitação, para quem em caso de necessidade (presente ou futura) o morador possa adaptar o fogo às suas necessidades sem grandes complexidades técnicas ou custos financeiros.

O lugar de estacionamento acessível será aquele que não está, em projecto, afecto ao uso exclusivo de um condómino específico. A regra geral tem de ser esta devido às diferentes formas de constituição da propriedade horizontal.

Em alguns edifícios os lugares de estacionamento não constituem fracções autónomas, sendo parte integrante das fracções de habitação. Noutros edifícios, os lugares de estacionamento são fracções autónomas, comercializadas separadamente.

Nestes dois casos, se o lugar acessível ficasse associado a um proprietário individual, só este o poderia utilizar, mesmo que não tivesse a sua mobilidade condicionada, e não teria de ceder esse lugar (talvez nem pudesse fazê-lo) a outro condómino que eventualmente precisasse dele.

A opção do legislador assegura que o espaço de estacionamento acessível pertence a todos os condóminos, e que portanto poderá ser utilizado de acordo com regras estabelecidas pelo condomínio.


Quem pode estacionar no lugar?

Nos termos do Código da Estrada (D.L. 265-A/2001, de 28 de Setembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto), nomeadamente do seu Artigo 71.º, n.º 1, alínea c), em parques e zonas de estacionamento é proibido estacionar “veículos de categorias diferentes” daquelas a que um lugar “tenha sido exclusivamente afecto”.

Não nos parece que esta “afectação exclusiva” corresponda, rigorosamente, à “reserva” do espaço preconizada pelo DL 163/06.

Pretenderia o legislador assegurar a existência, em cada edifício de habitação colectiva com mais de 12 lugares de estacionamento, de pelo menos um lugar de estacionamento para uso exclusivo de pessoas com deficiência? Estaria o Estado disposto a fiscalizar a utilização desse lugar?

Salvo melhor opinião, não nos parece ser essa a intenção do legislador.

Aliás, este “desencontro” de intenções é acentuado pela descrição das pessoas com direito a esse lugar.

Consultemos o D.L. 307/2003, de 10 de Dezembro, que aprova o cartão de estacionamento para pessoas com deficiência condicionadas na sua mobilidade. É a posse desse cartão que permite o estacionamento nos locais reservados para o efeito mediante a respectiva sinalização (cfr. Art.º 10.º).

Nos termos deste decreto, o referido cartão pode ser utilizado por pessoas com deficiência motora (especificamente, “toda aquela que, por motivo de lesão, deformidade ou enfermidade, congénita ou adquirida, seja portadora de deficiência motora, ao nível dos membros superiores ou inferiores, de carácter permanente, de grau igual ou superior a 60%”).

Esta caracterização abrange um universo mais restrito do que o conceito de pessoa com mobilidade condicionada, que no preâmbulo do DL 163/06 inclui também as pessoas “que, em virtude do seu percurso de vida, se apresentam transitoriamente condicionadas, como as grávidas, as crianças e os idosos.”

Parece-nos mais coerente com o espírito do DL 163/06 uma outra interpretação.

É incontroverso que o DL 163/06 exige, nos edifícios com mais de 12 lugares, a existência de um lugar adicional (supletivo).

É também incontroverso que esse lugar (pelo menos esse) tem de ser acessível.

Encontrando-se esse lugar localizado nas partes comuns do edifício, e sendo portanto propriedade do condomínio, competirá ao condomínio estabelecer as regras para uso desse lugar. Essas regras deverão dar preferência ao uso do lugar por veículos que transportem pessoas com a mobilidade condicionada.


PHG 15JUN2007

Agradecimentos: João Branco Pedro

terça-feira, junho 12, 2007

Habitação: contagem de pisos para ascensor

Comparando o RGEU e o novo decreto da acessibilidade, noto diferenças na forma de contar os pisos dos edifícios de habitação colectiva. Essas diferenças têm implicações na obrigação de instalar ascensor?


Sim, têm implicações.

Tanto o RGEU como o DL 163/06 definem um limiar de obrigatoriedade para a instalação (ou previsão) de meios mecânicos de comunicação vertical nos edifícios de habitação colectiva.

Onde haja uma coincidência relativamente ao objecto da regra, prevalece a regra mais exigente. Onde não exista essa coincidência, impõe-se uma leitura conjugada.

Refere o RGEU, no seu Artigo 50.º:

“1 – Nas edificações para habitação colectiva, quando a altura do último piso destinado a habitação exceder 11,5m, é obrigatória a instalação de ascensores. A altura referida é medida a partir da cota mais baixa do arranque dos degraus ou rampas de acesso ao interior do edifício.
2 – Os ascensores, no mínimo de dois (…) deverão servir todos os pisos de acesso aos fogos.
3 – Nas edificações para habitação colectiva com mais de três pisos e em que a altura do último piso, destinado à habitação, medida nos termos do n.º 1 deste artigo, for inferior a 11,5m deve prever-se espaço para futura instalação no mínimo de um ascensor.”


Por seu lado, refere o DL 163/06:

“3.2.1 – Nos edifícios de habitação com um número de pisos sobrepostos inferior a cinco, e com uma diferença de cotas entre pisos utilizáveis não superior a 11,5m, incluindo os pisos destinados a estacionamento, a arrecadações ou a outros espaços de uso comum (exemplo: sala de condóminos), podem não ser instalados meios mecânicos de comunicação vertical alternativos às escadas entre o piso do átrio principal de entrada/saída e os restantes pisos.

3.2.2 – Nos edifícios de habitação em que não sejam instalados durante a construção meios mecânicos de comunicação vertical alternativos às escadas, deve ser prevista no projecto a possibilidade de todos os pisos serem servidos por meios mecânicos de comunicação vertical instalados a posteriori, nomeadamente:
1) Plataformas elevatórias de escada ou outros meios mecânicos de comunicação vertical, no caso de edifícios com dois pisos;
2) Ascensores de cabina que satisfaçam o especificado na secção 2.6, no caso de edifícios com três e quatro pisos.

(…)

3.2.4 – Se os edifícios de habitação possuírem ascensor e espaços de estacionamento ou arrecadação em cave para uso dos moradores das habitações, todos os pisos dos espaços de estacionamento e das arrecadações devem ser servidos pelo ascensor.”



Há um conjunto de diferenças importantes, que vale a pena analisar separadamente.


1.ª Diferença: meios mecânicos

Considerando as plataformas elevatórias, o DL 163/06 introduz um limiar mais exigente para a introdução de meios mecânicos.

As plataformas elevatórias verticais ou de escada têm de ser previstas logo que o edifício tenha mais de um piso. Note-se que, como já foi referido num texto anterior (cfr. “Meios Mecânicos: cadeira elevatória acessível?”), a expressão “ou outros meios mecânicos” deve ter uma leitura restrita, i.e., compreende apenas os meios que cumpram com os parâmetros definidos no DL 163/06.


2.ª Diferença: pisos servidos

Enquanto que o RGEU exige o acesso por ascensor a todos os pisos de acesso aos fogos, o DL 163/06 alarga o serviço dos meios mecânicos aos pisos do edifício em que estejam localizados espaços comuns (estacionamento, arrecadações em cave, sala de condóminos, etc.).

Caso seja instalado de raiz, o ascensor (ou plataforma, se for o caso) deve servir todos esses pisos. Se ficar prevista a sua instalação futura, a mesma regra se aplicará.

Essa instalação futura deve ser prevista para vencer todos os desníveis. Caso, por exemplo, exista um desnível no átrio de entrada, entre a cota de soleira da porta de entrada e o patamar de acesso às escadas que servem os restantes pisos, deve ser prevista a instalação de um meio mecânico para vencer esse desnível (refere-se esta situação porque é frequente encontrá-la em edifícios com meia-cave).


3.ª Diferença: contagem de pisos

O método estabelecido no DL 163/06 é deliberadamente diferente.

Considerando que qualquer morador deve poder aceder não apenas à sua residência como a todos os espaços de uso comum do edifício (espaços que, afinal, também lhe pertencem), o legislador entendeu, em coerência, que os pisos onde se localizam esses espaços (doravante designados, neste texto, “pisos utilizáveis”) também devem ser contados quando se avalia a necessidade de instalar ascensores.

A altura de 11,5m deve ser medida com base nas indicações dadas pelo DL 163/06 (que são mais exigentes), usando como referência:

…superior, o último piso utilizável, mesmo que este não se destine a habitação (se a cobertura estiver total ou parcialmente aberta ao uso comum dos condóminos, o seu piso deve contar);

…inferior, o piso utilizável de cota mais baixa, mesmo que este não corresponda à cota de arranque da rampa de acesso ao interior do edifício.

Uma nota a propósito das arrecadações. Os pisos onde se encontrem arrecadações entram na contagem (cfr. 3.2.1, onde é feita menção genérica a “arrecadações”). Todavia, se houver de facto um ascensor instalado, a obrigação de servir o piso das arrecadações só existe se estas se encontrarem em cave (cfr. 3.2.4, onde é feita menção específica a “arrecadações em cave”).


Leitura conjugada

A leitura conjugada das normas deve ser feita caso a caso.

Teria sido melhor haver alguma harmonização, mas essa é uma questão recorrente no domínio da regulamentação aplicável à edificação, e a “imutabilidade” do RGEU não pode prejudicar a evolução legislativa.

Para análise de cada caso devem ser tidos em conta quatro factores:
…a diferença de cotas entre os pisos utilizáveis (medida nos termos referidos acima);
…o n.º de pisos utilizáveis;
…o que o RGEU exige nesse caso concreto;
…o que o DL 163/06 exige nesse caso concreto.

Prevalecerá sempre, como se disse, o maior grau de exigência aplicável.

A título exemplificativo, enunciamos a seguir as regras aplicáveis a três tipos de edifícios de habitação colectiva. Para simplificar o exemplo, considera-se que todos eles têm, em todos os pisos, a altura mínima piso a piso estabelecida no RGEU (2,70m, cfr. Artigo 65.º, n.º 1).

Refere-se entre parêntesis a fonte da regra que prevalece.


Edifício a “começar” no R/C:

R/C + 1 – Prever instalação de plataforma elevatória (DL 163)
R/C + 2 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
R/C + 3 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
R/C + 4 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL163)
R/C + 5 ou superior – Instalar 2 ascensores (RGEU)



Edifício com R/C + Garagem em cave

Garagem + R/C – Prever instalação de plataforma elevatória (DL 163)
Garagem + 2 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
Garagem + 3 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
Garagem + 4 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
Garagem + 5 ou superior – Instalar 2 ascensores (RGEU)


Edifício com R/C + Garagem em cave + Arrecadação em cave

Garagem + 2 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
Garagem + 3 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
Garagem + 4 – Prever instalação de pelo menos um ascensor (DL 163)
Garagem + 5 ou superior – Instalar 2 ascensores (RGEU)



4.ª Diferença: instalação futura

Última nota a propósito da forma diferente como no RGEU e no DL 163/06 se estipula a previsão de instalação futura dos meios mecânicos.

Enquanto que o RGEU se pronuncia genericamente a esse respeito (no artigo 50.º, n.º 3, refere apenas que “deve prever-se espaço”), o DL 163/06 é muito mais específico no seu ponto 3.2.3:

“A instalação posterior (…) deve poder ser realizada afectando exclusivamente as partes comuns dos edifícios de habitação e sem alterar as fundações, a estrutura ou as instalações existentes; devem ser explicitadas nos desenhos do projecto de licenciamento as alterações que é necessário realizar (…).”

Devem assegurar-se as condições necessárias à instalação de um ascensor que cumpra as normas de acessibilidade contidas neste decreto (o que desde logo nos leva a considerar as dimensões da cabina).


PHG 12JUN2007

Agradecimentos: João Branco Pedro

Vestiários e cabinas de prova: banco

Existem várias regras em relação ao banco dos vestiários, mas algumas parecem-me vagas: são dadas medidas, mas não se explica qual é a profundidade, e pede-se resistência mecânica, mas não se refere um valor concreto.


Referem as normas, no seu ponto 2.10.4:

“No interior dos vestiários e cabinas de prova deve existir um banco que satisfaça as seguintes condições:
1) Deve estar fixo à parede;
2) Deve ter uma dimensão de 0,4m por 0,8m;
(…)
4) Deve existir uma zona livre (…) de modo a permitir a transferência lateral de uma pessoa em cadeira de rodas para o banco;
5) Deve ter uma resistência mecânica adequada às solicitações previsíveis (…).”


Vejamos uma questão de cada vez.


Medidas

A profundidade será de 0,8m, e a largura de 0,4m.

De outra forma não poderia ser: 0,4m é uma largura manifestamente reduzida para uma pessoa se sentar a vestir, mais ainda quando se prevê a realização de transferências laterais.

Vale a pena referir que a “zona livre” referida na alínea 4 (onde é feita uma remissão para o ponto 4.1) é a zona de permanência, um rectângulo que deve medir no mínimo 0,75m x 1,20m. Se o que se pretende é a realização de transferências laterais, este rectângulo deve ser colocado com o seu lado maior adjacente ao bordo do banco (ao lado com 0,8m, portanto).


Resistência Mecânica

A resistência mecânica é exigida relativamente ao banco em si mesmo mas também às suas fixações à parede.

Essa “fixação à parede” não tem de ser vista como impeditiva de soluções igualmente eficazes: afinal, o que se pretende é que o banco não se mova.

Quais são as solicitações previsíveis?

Embora não seja expresso um valor (o que talvez fosse, de facto, previsível), essas solicitações podem deduzir-se de uma forma prática.

As normas requerem que seja possível uma transferência da cadeira de rodas para o banco. Se as normas também exigissem a presença de barras de apoio, supor-se-ia que seriam as barras a suportar o peso da pessoa. Não existindo barras, será o banco a suportar o peso da pessoa. Onde? Em qualquer ponto, incluindo nos pontos de maior vulnerabilidade, nomeadamente onde o momento da força seja maior, i.e., nos pontos mais afastados dos apoios.

Em projecto deve prever-se essa resistência pela escolha do tipo de banco e das suas fixações; numa fiscalização essa resistência deve ser testada.

Se o “peso da pessoa” varia de pessoa para pessoa, que força deve ser considerada?

À falta de referência concreta neste ponto, e por coerência com outras orientações constantes das normas, mais concretamente no ponto 2.9.16, pode tomar-se como necessário o valor especificado para as barras de apoio de aparelhos sanitários: uma carga não inferior a 1,5 kN (aprox. 153 Kg) aplicada em qualquer sentido.


PHG 12JUN2007

Agradecimentos: João Branco Pedro

segunda-feira, junho 11, 2007

Aplicação: postos de trabalho abrangidos?

Os locais onde se encontrem postos de trabalho também têm de ser acessíveis, ou essa obrigação só existe para os espaços destinados ao público?


Em princípio estão abrangidos.

Mas vamos por partes.

Em primeiro lugar, no âmbito das normas do DL 163/06, o que se deve entender por “posto de trabalho acessível”?

Neste ponto, deve sublinhar-se que nestas normas não são especificadas orientações relativamente a postos de trabalho específicos.

Inútil seria fazê-lo: por um lado, devido à imensa diversidade de tarefas existentes no mercado de trabalho; por outro, devido às necessidades específicas, também, elas muito variadas, que cada trabalhador pode sentir. A adaptação de um posto de trabalho conjuga as necessidades de determinada tarefa com as necessidades de determinado trabalhador.

Nada se especificando sobre o posto de trabalho propriamente dito, as normas debruçam-se sobre o meio edificado que o envolve, e que permite (ou não) aceder-lhe em condições de igualdade.


Assegurar o acesso

Embora os espaços destinados a funcionários não sejam, de uma forma geral, referidos no DL 163/06, uma leitura atenta das normas revela que nada os exclui, muito pelo contrário.

Salvo algumas excepções, as normas não fazem distinções de princípio entre espaços destinados ao público ou a funcionários, preocupando-se, isso sim, em salvaguardar a interligação de todos os espaços do edifício por meio de um percurso acessível.

Por isso, no âmbito das normas do DL 163/06, a questão que se coloca não é a da acessibilidade "do" posto de trabalho mas a do acesso "a" todos os espaços do edifício, incluindo aquele onde se encontre esse posto de trabalho e todos os outros espaços destinados aos funcionários (instalações sanitárias, vestiários para pessoal, etc.).

Por outras palavras, à partida o que está em causa é saber se os espaços destinados a funcionários terão de ter acesso através do percurso acessível.

E a conclusão a que devemos chegar é, claramente, que sim.

Podemos ler no ponto 2.1.1:

“Os edifícios e estabelecimentos devem ser dotados de pelo menos um percurso (…) acessível, que proporcione o acesso (…) entre a via pública, o local de entrada/saída principal e todos os espaços interiores e exteriores que os constituem.” (negrito nosso)

Quando, no ponto seguinte (2.1.2), se enumeram os espaços que podem não ser alcançáveis por meio do percurso acessível, nada encontramos que suporte a exclusão dos espaços destinados aos funcionários.

Note-se que quando na alínea 3) desse ponto se dispensam os “espaços de serviço que são utilizados exclusivamente por pessoal de manutenção e reparação”, os exemplos referidos não deixam qualquer margem para interpretações mais abrangentes (casa das máquinas de ascensores, depósitos de água, espaços para equipamentos de aquecimento ou de bombagem de água, locais de concentração e recolha de lixo, espaços de cargas e descargas).


Para além do percurso

Coloca-se, agora, uma segunda questão: quais as exigências relativamente aos restantes espaços destinados a funcionários?

Vale a pena fazer uma distinção. Os princípios a seguir diferem consoante se trate dos espaços onde se localizarão os postos de trabalho propriamente ditos (gabinetes de trabalho, cozinhas, etc.) e outros espaços destinados aos funcionários (instalações sanitárias, vestiários para pessoal, etc.).

Sobre os espaços onde se localizarão os postos de trabalho, muito pouco se refere nas normas, e o que se refere é pelo lado do público (por ex., Secção 2.12, Balcões e guichés de atendimento).

Ao princípio já enunciado (assegurar o acesso pelo percurso acessível) junta-se apenas um outro, bastante genérico: assegurar no interior de cada espaço o cumprimento das normas gerais aplicáveis, pressupondo-se que condições mais específicas deverão resultar de adaptações para funcionários específicos.

Relativamente aos outros espaços destinados aos funcionários, o princípio a seguir deverá ser o da igualdade de oportunidades de uso, i.e., os espaços que existirem (ou que tiverem de existir, por via da legislação aplicável no domínio da salubridade e segurança no trabalho) têm de ser utilizáveis por todos.

Nestes termos, se houver instalações sanitárias destinadas ao uso exclusivo dos funcionários, pelo menos uma terá de cumprir as normas do DL 163/06, constantes da Secção 2.9. E terá de considerar-se previsível o uso frequente dessa IS por pessoas com a mobilidade condicionada, exigindo-se assim o cumprimento das exigências referidas nos pontos 2.9.4, alínea 4), ou 2.9.6? A pergunta é pertinente, mas a resposta cabe à entidade licenciadora.


Uma mudança importante

Esta “obrigação” de assegurar a acessibilidade aos espaços destinados a funcionários não é, em rigor, nova.

Também o DL 123/97 não excluía expressamente, em nenhum dos seus pontos, estes espaços. Todavia, nas suas normas não continha o conceito de percurso acessível nem a obrigação de todos os espaços do edifício terem de ser alcançáveis por meio deste percurso.

Se dúvidas restarem sobre a intenção do legislador, uma breve consulta ao âmbito de aplicação do DL 163/06 torna-a mais clara: ao contrário do DL 123/97, que abrangia edifícios e estabelecimentos abertos ao público, o DL 163/06 já inclui, por exemplo, edifícios e centros de escritórios (cfr. Art. 2.º, n.º 2, alínea s)).

Para melhor entender este conceito da inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, vale a pena consultar o Decreto-Lei n.º 29/2001 de 3 de Fevereiro, que estabeleceu o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência nos serviços e organismos da administração central e local e entidades afins. No seu Artigo 2.º, especifica-se que as pessoas com deficiência abrangidas pelo sistema de quotas são aquelas que “possam exercer, sem limitações funcionais, a actividade a que se candidatam ou, apresentando limitações funcionais, estas sejam superáveis através da adequação ou adaptação do posto de trabalho e ou de ajuda técnica.”


Aplicação ao “mundo real”


É natural que uma interrogação se imponha: estas exigências são aplicáveis no “mundo real”? Dois breves comentários a esse propósito.

O primeiro sobre qual é, de facto, a realidade. A este respeito, não restam dúvidas: há uma significativa desvantagem no acesso ao emprego por parte das pessoas com deficiência.

Basta olhar para os dados do Censos 2001 relativos a Lisboa: só 23% da população residente com deficiência tinha o trabalho como principal meio de subsistência, quando a média para o total da população residente era de 49%.

É verdade que essa desvantagem resulta de uma conjugação de factores, mas as barreiras à acessibilidade nos edifícios e no espaço público constituem um factor objectivo e relevante, que acentua preconceitos e favorece práticas discriminatórias.

O segundo comentário sobre a aplicabilidade das normas ao parque edificado. Aqui, uma chamada de atenção para a distinção que tem de ser feita – e que o DL 163/06 prevê – entre a aplicação das normas aos edifícios existentes e aos edifícios novos.

É natural que a aplicação das normas aos edifícios existentes levante dificuldades por vezes insuperáveis. Em relação a essas, haverá que seguir o regime de excepções previsto no Artigo 10.º.


Atender ao âmbito de aplicação

É importante não perder de vista o âmbito de aplicação do DL 163/06 (cfr. Artigo 2.º).

Por exemplo: está em causa a obrigação de assegurar a acessibilidade aos postos de trabalho existentes, por exemplo, nas fábricas? Não está, porque as fábricas não são abrangidas por este decreto…

Quanto aos estabelecimentos comerciais, um detalhe importante. Estão abrangidos os estabelecimentos cuja superfície de acesso ao público ultrapasse os 150m2. Para a contagem dessa área não entram os espaços destinados a funcionários, como é óbvio. Mas esses espaços terão de ser acessíveis se o estabelecimento estiver abrangido por via da área destinada ao público.


PHG 11JUN2007

sexta-feira, junho 08, 2007

Habitação: projecto de moradia deve prever instalação de meios mecânicos?

O projecto de moradias deve prever a instalação de ascensor ou plataformas, i.e., tem de cumprir com o ponto 3.2.2?


Referem as normas, no seu ponto 3.2.2:

“Nos edifícios de habitação em que não sejam instalados durante a construção meios mecânicos de comunicação vertical alternativos às escadas, deve ser prevista no projecto a possibilidade de todos os pisos serem servidos por meios mecânicos de comunicação vertical instalados a posteriori, nomeadamente [plataformas elevatórias ou ascensores de cabina]”.

Esta exigência está inserida na Secção 3.2, relativa aos espaços comuns dos edifícios de habitação.

É, portanto, uma exigência que se faz relativamente aos espaços comuns, e que não abrange as áreas privativas dos fogos destinados a habitação.

É verdade que nas habitações organizadas em mais de um nível poderá vir a ser necessário instalar plataformas elevatórias ou ascensores. Para que isso seja possível, estipula-se em 3.3.5 a largura dos lanços, patamares e patins bem como a profundidade dos patamares superior e inferior de escadas localizadas no interior da habitação.

Como já vimos num texto anterior (cfr. “Habitação: largura de escadas interiores”) estas medidas são bastante limitativas, recomendando-se valores superiores.

Ao contrário dos espaços comuns, as normas nada especificam relativamente ao interior das habitações sobre alguns aspectos relevantes para a instalação destes meios mecânicos (por ex. características estruturais de escadas ou configuração de instalações eléctricas), pressupondo que o cumprimento das normas criará, à partida, as condições suficientes para essa instalação (que de qualquer forma não poderá ser realizada sem o necessário projecto).


PHG 8JUN2007

Habitação: obrigatório adaptar fogos existentes?

Se nem há verbas suficientes para reabilitar os edifícios existentes, como é que se vai, neste País, conseguir tornar acessíveis as habitações existentes, ainda por cima num prazo tão curto?


A questão, na realidade, não se coloca, porque o DL 163/06 não obriga à adaptação dos edifícios de habitação existentes.

A obrigatoriedade de adaptar edifícios existentes dentro de determinado prazo está estabelecida no Artigo 9.º do referido DL 163/06.

Uma leitura atenta dos n.ºs 1 e 2 desse artigo esclarece que a adaptação é exigida para “as instalações, edifícios e estabelecimentos, equipamentos e espaços abrangentes referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 2.º”.

Ora, lendo o Artigo 2.º verificamos que o seu n.º 1 diz respeito às “instalações e respectivos espaços circundantes da administração pública central, regional e local”, bem como de entidades afins, e que o seu n.º 2 diz respeito a “edifícios, estabelecimentos e equipamentos de utilização pública e via pública”.

Os edifícios habitacionais vêm de facto referidos no Artigo 2.º, mas no n.º 3.

Pode acontecer que, no âmbito de obras de ampliação de um edifício de habitação, possa haver a obrigação de cumprir as normas do DL 163/06 (já discutimos essa possibilidade num texto anterior, cfr. “Licenciamento: obras de ampliação abrangidas?”).

Mas essa é uma situação que não tem nada a ver com a obrigatoriedade de adaptar edifícios de habitação dentro de prazos determinados. Essa obrigatoriedade não existe, de todo, no DL 163/06.


E a habitação social?

Esta questão pode ganhar contornos diferentes se olharmos para o parque habitacional público, nomeadamente para os edifícios de habitação geridos com fins sociais pela Administração Central ou pelas autarquias.

A obrigatoriedade de promover a acessibilidade nesse parque habitacional existente decorre não do DL 163/06 mas da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto.

Essa lei tem por objecto prevenir, proibir e punir a prática de “actos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer (…) sociais ou outros (…) em razão de uma qualquer deficiência.”

O Direito à Habitação, recorde-se, está consagrado na Constituição da República Portuguesa (cfr. Artigo 65.º).

Pode uma pessoa portadora (por exemplo) de deficiência motora ter mais dificuldade em obter uma habitação social, comparativamente com outras pessoas numa situação comparativamente igual (i.e., residentes no mesmo Concelho e com as mesmas carências económicas e de habitação)?

Não pode. Nos termos da Lei 46/2006, isso constituiria um caso de discriminação (cfr. Art. 3.º, alínea b).

Caso o parque habitacional não disponha de fogos acessíveis, deve a entidade pública que o gere procurar assegurá-los o mais rapidamente possível (ou adaptando edifícios existentes, ou construindo de raiz novos edifícios), para que a falta de acessibilidade não constitua um factor de discriminação no acesso à habitação social.


PHG 8JUN2007

Meios Mecânicos: cadeira elevatória acessível?

Foto: CMLisboa, Programa Casa Aberta (s.d.)



Consultando os catálogos de plataformas elevatórias, reparei que existem cadeiras elevatórias, que acompanham a escada, e que exigem menos espaço. Estas cadeiras são aceitáveis à luz das normas do DL 163/06?


No interior da habitação o morador deverá instalar o dispositivo mais adequado às suas necessidades. Esse dispositivo pode ser uma cadeira elevatória, nada nas normas o impede de o fazer.

Já nos espaços comuns dos edifícios de habitação bem como em todos os outros espaços abrangidos pelo DL 163/06, as cadeiras elevatórias não são consideradas acessíveis.

Vejamos o que dizem as normas.

No ponto 4.8.2, alínea 3), exige-se que onde haja ressaltos no piso superiores a 2cm, exista uma forma alternativa de vencer o desnível, que pode consistir numa rampa ou num dispositivo mecânico de elevação.

São especificados nas normas dois tipos de dispositivos mecânicos de elevação: ascensores (Secção 2.6) e plataformas elevatórias (Secção 2.7).

Não havendo referência a outro dispositivo, deve concluir-se que nos termos do DL 163/06 só estes dois tipos de dispositivos são aceites.

Enquadra-se a cadeira elevatória nalgum destes tipos?

Não se enquadra na Secção 2.6, pois um ascensor é composto, entre outros elementos, por uma cabina.

Também não cumpre os parâmetros definidos na Secção 2.7. Uma cadeira não é uma plataforma, e basta ler o ponto 2.7.1 para concluir isso mesmo: “as plataformas elevatórias devem possuir dimensões que permitam a sua utilização por um indivíduo adulto em cadeira de rodas, e nunca inferiores a 0,75m por 1m.”

A plataforma proporciona à pessoa em cadeira de rodas uma autonomia que a cadeira não assegura. Enquanto que a plataforma permite ao utilizador permanecer na cadeira de rodas, a cadeira obriga-o a efectuar uma transferência, que ele pode não ser capaz de fazer sozinho. E mesmo que o utilizador conseguisse efectuar essa transferência… depois quem transportaria a cadeira de rodas escada acima e escada abaixo?

Concluindo-se que a cadeira elevatória não é uma solução aceitável para os espaços exteriores à habitação, deve também concluir-se que esse dispositivo não constitui uma opção a considerar na instalação a posteriori nos espaços comuns dos edifícios de habitação.

Por outras palavras, quando no ponto 3.2.2, alínea 1), se exige que seja prevista (e demonstrada) a instalação futura de “plataformas elevatórias de escada ou outros meios mecânicos de comunicação vertical”, não está a admitir-se a escolha de uma cadeira, mas de outros dispositivos que se enquadrem nos parâmetros estabelecidos nas Secções 2.6 ou 2.7 (por exemplo, de um ascensor ou de uma plataforma elevatória vertical).


PHG 8JUN2007

Duche: assento necessário?

Se for possível entrar de cadeira de rodas no duche não é necessário instalar um assento no interior?


Não é obrigatório, mas recomenda-se.

As normas referem, no seu ponto 2.9.8:

“As bases de duche acessíveis devem permitir pelo menos uma das seguintes formas de utilização por uma pessoa em cadeira de rodas:
1) Entrada para o interior da base de duche da pessoa na sua cadeira de rodas;
2) A transferência da pessoa em cadeira de rodas para um assento existente no interior da base de duche.”

Especificam-se em 2.9.9 as exigências a cumprir no caso de ser necessária a transferência, e em 2.9.10 no caso de a cadeira poder entrar.

Em 2.9.10 não se exige um assento no interior do duche.


Recomendação

Embora o não seja exigida a instalação de um assento no interior da base de duche em que a cadeira de rodas possa entrar, essa instalação é recomendável, para maior conforto e autonomia do utente.

A explicação é bastante simples. Se a pessoa tomar duche na cadeira, a cadeira fica molhada. Passe a comparação, é um pouco a mesma coisa que tomar duche calçado e depois ter de andar com os sapatos molhados… não é confortável.

Além disso, há cadeiras que não se podem molhar, por exemplo as que têm componentes eléctricos ou peças que podem enferrujar.

Haverá pessoas que, na realidade, terão sempre de tomar duche com apoio de terceiros, lavando apenas algumas partes do corpo, sentadas na sua própria cadeira ou numa cadeira de rodas para duche.

Mas também haverá sempre pessoas que conseguem tomar duche sozinhas, efectuando transferência para um assento. Não dispor de um assento no interior da base de duche restringe as opções, obrigando essas pessoas a solicitar o apoio de terceiros quando dele não necessitariam.


PHG 8JUN2007

Banheira: possível banco móvel?

Em instalações sanitária de utilização geral podem usar-se bancos móveis em vez dos assentos fixos à parede? Isso permitiria guardar o banco.


Resulta evidente da leitura das normas a exigência de fixação segura dos assentos localizados no interior de banheiras e bases de duche.

No caso das banheiras acessíveis, leia-se o ponto 2.9.7, alínea 4): “se o assento estiver localizado no interior da banheira pode ser móvel, mas em uso deve ser fixado seguramente de modo a não deslizar”.

No caso das bases de duche acessíveis, leia-se o ponto 2.9.11, alínea 4): “devem existir elementos que assegurem que o assento rebatível fica fixo quando estiver em uso”.

Note-se que apenas no caso das bases de duche se especifica que o assento estará fixo à parede: em 2.9.11, alínea 3) diz-se que será rebatível, e na ilustração de 2.9.9, alínea 5) é possível verificar que o rebatimento deve ter o seu ponto de rotação fixo na parede.

Na banheira são admitidas outras soluções, desde que se assegure uma fixação segura durante o uso.

Embora possa estar dotado de pés antiderrapantes, o banco clássico não cumpre essa exigência de fixação segura em uso, não sendo admissível nas instalações sanitárias de uso geral.

Para conhecer outras soluções para assentos de banheira, sugerimos a consulta a um distribuidor de ajudas técnicas.


PHG 8JUN2007