sexta-feira, julho 20, 2007

HABITAÇÃO: acesso à moradia no interior do lote

O percurso entre a entrada no lote e a entrada na moradia tem de ser acessível?


Em princípio, sim.

Antes de mais, para clarificar o que estamos a analisar: trata-se de um percurso situado no interior de um lote que assegura o acesso a um edifício de habitação unifamiliar.

O percurso localiza-se, portanto, no interior de um terreno privado que é utilizado de forma exclusiva pelos moradores. Não se trata, por isso, de via pública (definida pela DGOTDU* como “uma via de comunicação terrestre afectada ao trânsito público”).

Que regras se aplicam, então?

Para responder a esta pergunta será necessário analisar o conceito de percurso acessível definido nas normas e os dois enquadramentos possíveis para considerar este percurso.

Comecemos pelo conceito de percurso acessível.

O que o DL 163/06 pretende assegurar é a existência de um percurso acessível contínuo, sem interrupções, que permita a qualquer pessoa aceder de forma autónoma a todos os espaços destinados ao público (ou pelo menos a um de cada tipo), e a um conjunto mínimo de espaços de uso privado (no caso da habitação).

Este percurso deve ligar (como se de uma instalação eléctrica se tratasse, ou seja, sem cortes) todos esses espaços, atravessando todas as fronteiras que existam entre eles (portas, portões, átrios, corredores, etc.).

A título ilustrativo, vale a pena ler o ponto 1.1.2:

“A rede de percursos pedonais acessíveis deve ser contínua e coerente, abranger toda a área urbanizada e estar articulada com as actividades e funções urbanas realizadas tanto no solo público como no solo privado.”

Em cada parte do meio edificado, as normas do DL 163/06 exigem a existência de “pelo menos um percurso acessível”, seja na via pública (cf. 1.1.5), nos edifícios (cf. 2.1.1) ou, de uma forma ligeiramente diferente, na habitação (cf. 3.3.7).


Duas hipóteses de enquadramento

Aqui chegados, podemos concluir que o espírito das normas aponta no sentido de se assegurar a acessibilidade do percurso que liga a entrada no lote à entrada na moradia.

Já não é óbvia, na minha opinião, a melhor forma de enquadrar esta parte do terreno. Não me parece, contudo, que seja imprescindível resolver essa questão, porque chegaremos à mesma conclusão se explorarmos as consequências de qualquer um dos dois enquadramentos possíveis.

Vejamos.

Se considerarmos o espaço exterior pertencente ao lote como parte integrante do edifício (i.e., uma parte exterior que o constitui, que é, por ex., objecto de arranjos exteriores), então aplica-se o princípio estabelecido no ponto 2.1.1, que refere o seguinte:

“Os edifícios e estabelecimentos devem ser dotados de pelo menos um percurso (…) acessível, que proporcione o acesso (…) entre a via pública, o local de entrada/saída principal e todos os espaços interiores e exteriores que os constituem.”

Se, por outro lado, considerarmos esse espaço exterior (que, não sendo público, está sujeito a um uso condicionado mas essencialmente privado) como integrando a “área privada do fogo” (expressão utilizada no Artigo 23.º do DL 163/06), então teremos de cumprir o ponto 3.3.7, considerando que “a porta de entrada/saída” aí referida é a porta de entrada no lote.


Acesso agora ou no futuro?

A adaptação futura em caso de necessidade é o princípio seguido em relação a outras partes da habitação (instalações sanitárias, por ex.), mas não se aplica a este percurso.

A esse respeito as normas são claras, salvo se houver razão para não as cumprir, por ex., caso haja incompatibilidade com os direitos constituídos pela
aprovação de PIP ou loteamento ou caso se trate de uma reconstrução (cf. Art.º 60.º do DL 555/99, na sua versão actual).

Terá de haver rampas, elevadores, plataformas elevatórias? Se não forem encontradas soluções mais discretas, sim.

Este é um exemplo de como a acessibilidade deve ser considerada desde o início do projecto, nomeadamente na fase de implantação.


PHG 20JUL2007

* DGOTDU (2005), “Vocabulário de Termos e Conceitos do Ordenamento do Território”

quinta-feira, julho 19, 2007

Pavimento: Gravilha acessível?

Podemos usar gravilha num percurso acessível?


Depende. Se estiver solta, não. A gravilha solta não é acessível, e nos termos do DL 163/06 não pode ser usada no percurso acessível.

Referem as normas, no seu ponto 4.7.1:

“Os pisos e os seus revestimentos [do percurso acessível] devem ter uma superfície:
1) Estável – não se desloca quando sujeita às acções mecânicas decorrentes do uso normal;
2) Durável – não é desgastável pela acção da chuva ou de lavagens frequentes;
3) Firme – não é deformável quando sujeito às acções mecânicas decorrentes do uso normal (…)”.

As características aqui descritas também são enunciadas, por exemplo, nas
normas de acessibilidade norte-americanas, onde é usada a expressão “firm, stable and slip-resistant” (firme, estável e antiderrapante).


Os conceitos

Poderá haver, nas nossas normas, alguma sobreposição entre os conceitos de “estável” e o de “firme”, e nem nas normas portuguesas nem nas norte-americanas se definem parâmetros específicos.

Vale a pena, por isso, compreender os conceitos de firmeza, estabilidade e durabilidade.

A firmeza refere-se à resistência à deformação no momento do uso. O pavimento não pode deformar-se para além do mínimo inevitável. A verificar-se, esta deformação deve situar-se na casa dos milímetros. Veja-se, como exemplo, que em relação aos tapetes verificamos em 4.7.3 que estes devem possuir uma espessura máxima de 1,5cm (descontando a parte rígida do suporte).

A estabilidade diz respeito à constância da forma, ou seja, caso ocorra uma deformação, o pavimento deve recuperar a sua forma logo depois. É o que acontece, por exemplo, com os pavimentos de borracha dos parques infantis.

Já a durabilidade se relaciona com o desgaste por acção dos elementos ou da limpeza.

Quanto à “boa aderência” do pavimento, ela vem referida no ponto 4.7.7, em termos que se aplicam aos espaços exteriores. Não sendo estipulados coeficientes de atrito concretos, deverá seguir-se a classificação dos materiais dada pelo produtor quando devidamente certificada.


Voltando à gravilha solta…

Decorre das normas que aquilo que se pretende é um pavimento que não se deforme quando sujeito à acção de pés, cadeiras de rodas, andarilhos, bengalas, etc.

Nas superfícies em que o uso normal também inclua veículos motorizados e outro tipo de cargas, o pavimento também não se poderá deformar devido a essas cargas.

Como facilmente se constata, a gravilha solta não cumpre nenhum destes requisitos:

não é firme porque se deforma no momento do uso;

não é estável porque não recupera a sua forma depois de deformada;


… e também não é durável porque a presença de água também tende a alterar, com o tempo, a sua forma (o escoamento das águas vai cavando desníveis).


Cores claras?

Da leitura das normas resulta ainda uma outra questão. Refere o ponto 4.7.2:

“Os revestimentos de piso devem ter superfícies com reflectâncias correspondentes a cores nem demasiado claras nem demasiado escuras (…) é recomendável que a reflectância média das superfícies dos revestimentos de piso nos espaços encerrados esteja compreendida entre 15% e 40%.”

A reflectância é a quantidade de luz que a superfície reflecte; a percentagem refere-se à porção de luz que o pavimento “devolve” relativamente à quantidade que recebeu.

É verdade que as normas fazem uma recomendação (i.e., o cumprimento não é obrigatório) e que os valores são recomendados para os “espaços encerrados”.

É importante, mesmo assim, chamar a atenção para o (grande) problema da reflectância nos espaços exteriores, provocado pelas superfícies revestidas a cores claras, nomeadamente calçada e gravilha brancas, com pouca ou nenhuma sombra.

Esse tipo de superfícies gera desconforto, de uma forma geral, a todos os seus utilizadores, e cria problemas concretos (encandeamento, desorientação, insegurança) às pessoas que, não sendo cegas, têm problemas ao nível da visão.


Gravilha nunca?

Referimo-nos, até aqui, à gravilha solta.

Novos produtos surgidos no mercado nacional permitem, hoje, obter pavimentos firmes e estáveis com gravilha que, além disso, mantém a sua permeabilidade (passe a publicidade, eis um
exemplo).

Trata-se de agregantes que são adicionados à gravilha, formando uma “pasta” que, depois de aplicada, seca em poucas horas. O produto é transparente, e a gravilha mantém a sua cor (o que nos permite escolher as cores).

Com este tipo de aplicação, obtemos um revestimento que pode ser integrado no percurso acessível.

Recomendo que use uma granulometria reduzida (para reduzir a dimensão dos orifícios, o que facilitará a limpeza) e que a gravilha seja rolada (para evitar arestas cortantes).

Usei este tipo de solução, por exemplo, nos caminhos interiores de uma horta para crianças, quando adaptei a Quinta Pedagógica dos Olivais (a foto não ajuda muito...).


(Quinta Pedagógica dos Olivais, Lisboa, 2005, foto: PHG)


PHG 19JUL2007

quarta-feira, julho 18, 2007

Formação em Acessibilidade

Está aberta uma lista de pré-inscrições para futuras edições da Acção de Formação em Acessibilidade e Design Universal.

Cada acção decorre em dois dias consecutivos, das 9h30 às 17h30 (total: 14 horas).

As acções serão realizadas em Lisboa ou, caso haja um número suficiente de interessados, noutros pontos do País.

Para se pré-inscrever basta enviar-nos o seu nome, localização e contacto (e-mail e telefone) para acesso.portugal@gmail.com

A inscrição só se concretizará em função de datas e locais concretos.

Provedor da Arquitectura

Saiba aqui o que o Provedor da Arquitectura, Francisco Silva Dias, tem a dizer sobre a Acessibilidade e a leghislação vigente, na sequência do Fórum Arquitectura Acessível, realizado no Porto pela Secção Regional Norte da Ordem dos Artquitectos.

sexta-feira, julho 13, 2007

Programa Nacional de Formação em Acessibilidade

Uma boa notícia para os muitos colegas que têm vindo efectuar a sua pré-inscrição em futuras acções de formação, pedindo que elas sejam realizadas na sua área geográfica:

O Conselho Directivo Nacional da Ordem (CDN) aprovou em 26 de Junho p.p. o Programa Nacional de Formação para Arquitectos em Acessibilidade e Design Universal.

Principais objectivos:

...Descentralizar as acções de formação da Ordem, em parceria com a preciosa rede de delegações e núcleos da Ordem, “libertando” os membros sedeados fora de Lisboa e Porto de suportar os custos de deslocação e alojamento;

...Proporcionar aos arquitectos formação em matérias relevantes para o exercício da profissão - caso da Acessibilidade, uma matéria complexa recentemente consagrada na legislação (DL 163/06, de 8 de Agosto) que tem suscitado dúvidas em todo o País.

Concretização simples e comparticipada

A concretização deste esforço de descentralização depende, agora, das delegações e núcleos. Encontrando-se produzido o conteúdo (acção de formação e respectivos materiais), bastar-lhes-á, através de um sistema prático e simples, realizar as diligências necessárias à concretização da acção no seu espaço geográfico.

O CDN assumirá, na íntegra, as despesas associadas à descentralização (deslocação e alojamento do formador) e a produção dos materiais de formação. Além disso, também apoiará a divulgação de cada acção agendada através do portal da Ordem dos Arquitectos e do boletim.

A acção de formação, sobre Acessibilidade e o DL 163/06, tem a duração de dois dias consecutivos (total de 14 horas) e conta com um formador em sala, para um máximo de 20 formandos. Datas disponíveis para agendamento: de 4 de Setembro a 31 de Dezembro de 2007.

Caso a delegação ou núcleo pretenda cobrar pela inscrição nesta acção de formação, esta não deverá ultrapassar os € 100 (com IVA incluído), podendo, naturalmente, ser cobrados valores inferiores.

Informações:

--- Cidalina Duarte (secretariado do CDN): tel. 21 324 1115, e-mail: cdn@ordemdosarquitectos.pt

--- Pedro Homem de Gouveia (Coordenador Pedagógico), tel. 917 32 28 24, acesso.portugal@gmail.com