sexta-feira, junho 05, 2009

Âmbito: edifício de escritórios “particulares” abrangido?



No início do artigo 2.º, n.º 2, onde se refere os edifícios de escritórios, existe a expressão “edifícios (…) de utilização pública”.

Nesses termos, um edifício destinado a escritórios particulares, onde não existe um balcão de atendimento ao público, está abrangido pelo DL 163/2006?



Sim.

Os edifícios de escritórios, estão abrangidos pelo DL 163/2006, nos termos do artigo 2.º, n.º 2, alínea s), onde se refere “edifícios e centros de escritórios”.

O facto de o edifício ser destinado a escritórios "particulares” também não o dispensa de cumprir o DL 163/2006.

Primeiro, porque é evidente que o diploma se aplica a edifícios particulares (veja-se, por exemplo, o disposto no artigo 12.º, alínea c), onde se determina que compete às câmaras municipais fiscalizar o cumprimento dos deveres impostos aos particulares).

Segundo, porque não é líquido que a expressão usada na abertura do artigo 2.º, n.º 2 (“edifícios, estabelecimentos e equipamentos de utilização pública e via pública”) sirva para excluir do âmbito do DL 163/2006 os edifícios com escritórios “particulares” (aqui entendidos como não tendo balcão de atendimento ao público, por exemplo).

Quando procuramos dar um sentido concreto às expressões “utilização pública”, ou “edifícios e estabelecimentos que recebem público” (encontramos esta outra expressão no preâmbulo do diploma) devemos ter o cuidado de não inferir dos seus termos, necessariamente, a entrada franca ou a existência de espaços onde se efectue atendimento do público.

É indispensável reconhecer e sublinhar os contornos imprecisos do universo designado pela expressão “público”, bem como do conjunto de objectivos legítimos de que pode resultar a utilização deste edifício pelo “público” (entendido no seu conjunto e nas suas partes, ou seja, em cada cidadão).

No fundo, o que está em causa é saber se com o uso da expressão “utilização pública” o legislador pretendeu estabelecer uma leitura restritiva do âmbito de aplicação do DL 163/2006.

Analisando a legislação, forçosamente concluímos que não.

Vale a pena, por exemplo, citar o preâmbulo do I Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade (Resolução do Conselho de Ministros n.º 120/2006, de 21 de Setembro), onde o legislador reconhece a “influência do meio ambiente como elemento facilitador ou como barreira no desenvolvimento, funcionalidade e participação”, defendendo que “as barreiras existentes devem ser entendidas como potenciais factores de exclusão social, que acentuam preconceitos e criam condições propícias a práticas discriminatórias.” [sublinhado nosso]

O desenvolvimento da personalidade, a participação e a igualdade são, como se sabe, direitos constitucionais, e o facto de as barreiras à acessibilidade prejudicarem a sua concretização leva-nos forçosamente a concluir que dificilmente o legislador utilizaria a expressão “utilização pública” com uma intenção restritiva, ou seja, com a intenção de limitar a aplicação das normas técnicas de acessibilidade a edifícios com entrada franca e zona especificamente destinada ao atendimento do público.

Em suporte deste entendimento pode citar-se o disposto na Lei 46/2006, de 28 de Agosto, onde se proíbe e pune a discriminação com base na deficiência. No seu artigo 4.º, este diploma classifica como práticas discriminatórias as “acções ou omissões dolosas ou negligentes, que, em razão da deficiência, violem o princípio da igualdade, designadamente:
a) A recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens ou serviços;
b) O impedimento ou a limitação ao acesso e exercício de normal de uma actividade económica;
(…)
e) A recusa ou a limitação de acesso ao meio edificado ou a locais públicos ou abertos ao público”.
[sublinhado nosso]

Note-se que se procurássemos estabelecer um limite para o alcance da expressão “utilização pública” poderíamos talvez colocá-lo nos edifícios habitacionais… apenas para verificar que mesmo a esses se aplicam normas técnicas de acessibilidade definidas no DL 163/2006.

Devemos concluir, portanto, que o edifício de escritórios está abrangido pelo DL 163/2006, mesmo que não disponha de zona específicamente destinada ao atendimento ao público.


PHG 5JUN2009

WC: sanita “para deficientes”

(c) 2002 Pedro Homem de Gouveia

O DL 163/2006 exige que o bordo superior da sanita esteja a 45cm de altura do piso (mais ou menos 1cm).

As “sanitas para deficientes” que encontro nos catálogos de loiças sanitárias não cumprem esta norma. Posso usá-las?


Não tem de usá-las, nem pode.

Existe, de facto, o hábito de colocar nas instalações sanitárias acessíveis as sanitas designadas como “para deficientes” nos catálogos de loiças sanitárias.

Deve notar-se, todavia, que esse hábito não decorre da lei e pode, inclusive, violar as suas disposições.

Como se sabe, nas normas não encontramos a expressão “devem ser usadas sanitas designadas como para deficientes nos catálogos”. Nem se exige que a abertura frontal que estas sanitas geralmente têm.

O que o DL 163/2006 de facto estipula no ponto 2.9.4, alínea 1), é a altura ao bordo superior da sanita. Por isso, se a sanita não cumprir com o exigido nesse ponto, ela não poderá ser usada. Independentemente de ser designada como “sanita para deficientes” num catálogo.

Como fazer?

A alternativa é muito simples, na verdade: qualquer sanita suspensa que fique com o bordo superior à altura indicada cumpre a exigência do DL 163/2006. Existe portanto uma infinidade de opções – em formato, estilo, cor, etc.

Uma nota adicional: as referidas sanitas “para deficientes” muitas vezes não têm um espaço livre sob o assento que permita a sua sobreposição à zona de rotação (círculo de 1,5m de diâmetro) exigida no interior da instalação sanitária.


PHG 5JUN2009