A implantação escolhida para o edifício que estou a projectar torna necessária uma rampa. Esta rampa ocupará bastante espaço do lote e a sua construção fará crescer o custo da obra. Pode argumentar-se que esta rampa requer “a aplicação de meios económico-financeiros desproporcionados ou não disponíveis” e deixá-la por construir?
Não.
O argumento avançado consta, de facto, do DL 163/2006, mas não se aplica a esta situação. Vejamos porquê.
Refere o decreto, no seu Artigo 10.º, n.º 1:
“Nos casos referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo anterior, o cumprimento das normas técnicas de acessibilidade (…) não é exigível quando as obras necessárias à sua execução sejam desproporcionadamente difíceis, requeiram a aplicação de meios económico-financeiros desproporcionados ou não disponíveis, ou ainda quando afectem sensivelmente o património cultural ou histórico (…)”.
Ora, quais são “os casos referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo anterior” ? As instalações, edifícios, estabelecimentos, equipamentos e espaços abrangentes cujo início de construção seja anterior à entrada em vigor do DL 163/2006.
É portanto a estes casos – e apenas a eles – que o n.º 1 do Artigo 10.º se refere.
Naturalmente que o cumprimento das normas em edifícios classificados (por exemplo), poderá ficar condicionado – mas isso é por outras razões, que não as previstas no presente decreto.
Garantia do existente
Porque falamos de excepções, deve também lembrar-se o disposto no Artigo 3.º, n.º 2:
“A concessão de licença ou autorização para a realização de obras de alteração ou reconstrução das edificações referidas [nos n.ºs 2 e 3 do Artigo 2.º] não pode ser recusada com fundamento na desconformidade com as presentes normas técnicas de acessibilidade, desde que tais obras não originem ou agravem a desconformidade com estas normas e se encontrem abrangidas pelas disposições constantes dos artigos 9.º e 10.º”.
Trata-se, aqui, de salvaguardar o princípio da garantia do existente, que já vem expresso no Artigo 60.º, n.º 2 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (DL 555/99, na sua redacção actual).
Note-se que nos termos da redacção específica dada a esse princípio pelo DL 163/2006, terão de se verificar cumulativamente (i.e., em simultâneo) três condições:
…tratar-se de obras de alteração ou reconstrução (como já vimos noutro texto, as de ampliação não “cabem” aqui);
…o edifício ainda estar dentro do prazo dado para adaptação (cf. Art.º 9.º);
…aplicar-se um ou mais critérios de excepção (cf. Art.º 10.º).
E projectos novos?
Lendo atentamente o Artigo 10.º, chegamos à conclusão de que em todos os casos em que “o processo de aprovação, licenciamento ou autorização” tenha sido iniciado após a entrada em vigor do DL 163/2006, se exige o cumprimento integral das normas técnicas de acessibilidade.
É este o princípio que se aplica, sublinhe-se, aos projectos de novos edifícios habitacionais.
Só nas situações em que o cumprimento é “impraticável” é que se admite a abertura de uma excepção – que será pontual (i.e., norma a norma, cf. Art.º 10.º n.º 5) e devidamente fundamentada (cf. Art.º 10.º n.º 6).
O que devemos entender, exactamente, por impraticável? Segundo o Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, da Michaelis, algo “que não se pode pôr em prática, impossível”.
Esta “impraticabilidade” remete, portanto, para condicionantes incontornáveis, que podem decorrer…
…de constrangimentos físicos inultrapassáveis,
…ou de outras exigências com maior força jurídica,
…ou de direitos adquiridos (questão já analisada, em parte, noutro texto).
E agora, que fazer?
A acessibilidade depende de decisões em todas as fases (e escalas) do projecto, da implantação à escolha dos puxadores e torneiras. E (como parece ser aqui o caso), decisões de projecto podem criar problemas de projecto.
Quanto mais tarde a acessibilidade for tida em conta nesse processo decisório, mais problemas haverá para resolver. Desenhar primeiro e “martelar” depois o projecto para cumprir com as normas técnicas do DL 163/2006 é um processo frustrante, trabalhoso e, em termos de horas de trabalho, ruinoso.
Recorde-se que o “impraticável” se justifica face a condicionantes físicas (ou legais) do sítio, ou a direitos adquiridos que prevaleçam, e não face a decisões tomadas no processo de projecto.
Neste caso, a implantação resulta de uma decisão do projectista (que refere que ela foi “escolhida”), e é devido a essa decisão que existe, agora, a necessidade de rampa.
Por isso, neste caso, ou se muda a implantação… ou se constrói a rampa.
PHG 18OUT2007
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